quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Leitora dos livros alheios

Cheguei a uma conclusão fatídica em minha vida. Não gosto de livrarias. Mil perdões a todos os escritores, aos editores, as gráficas. Nunca passei muito tempo em livrarias, nunca encontrei pessoas em livrarias, mas tampouco havia pensado na razão disto antes.
Hoje, a convite do meu irmão, fui a uma tradicional livraria. Ele estava procurando por um novo livro dessas decalogias que surgem como baratas. Eu, enquanto aguardava, experimentei um desconforto, sem duvida ampliado pelo cansaço de um dia exaustivo. Em outras palavras; fiquei impaciente e não conseguia me distrair folheando os lançamentos. Pela primeira vez, relembrei as inúmeras vezes em que fui a livrarias e não me distrai. Mas por que raios não sou freqüentadora assídua de livrarias?
Eu devoro livros. Tenho a estranha mania de ler vários ao mesmo tempo, para não sentir-me órfã quando acabar. Nesse momento, estou lendo três livros: um católico, um espírita e a biografia do Keith Richards. Dizem-me os amigos que é impossível que eu consiga ler mais de um. Rebato: eu leio sim. Quando uma historia começa a ficar cansativa, mudo de livro, e após descansar, retomo a primeira leitura. Assim, poucas vezes iniciei um livro e o deixei interminado.
Posto isso, eu devia ser figurinha carimbada em livrarias, devia ser conhecida pelos livreiros. Não sou. Compro pouquíssimos livros. Graças a Deus, tenho amigos que cultivam a bibliotecultura e são generosos comigo. Há outro motivo, que em parte explica minha pouca assiduidade em livrarias: gosto de ler algo que me tenha sido indicado. Não porque confie cegamente na filtragem de críticos e dos meus amigos, mas principalmente porque dessa forma terei com quem discutir o tema após a leitura, aquela interação divertida : já chegou na parte em que o fulano muda para a Suazilandia?
Um personagem de Umberto Eco, dono de um sebo, tinha uma imensa biblioteca em casa. Os visitantes, desavisados , sempre o indagavam: o senhor já leu isso tudo? E a resposta era impaciente: claro que não! Se já tivesse lido, por qual razão os guardaria?
Não tenho porque comprar livros. Raramente os leio mais de duas vezes, e quando o faço, o intervalo entre as leituras não justifica a aquisição, somente uma nova ida à biblioteca. Mais uma razão forte seria o quanto gosto do clima de bibliotecas e o quanto desgosto do clima de livrarias. NA biblioteca, se você se interessa pelo livro, pode sentar-se tranquilamente e ler o primeiro capitulo, ou pode perguntar ao bibliotecário, uma pessoa invariavelmente simpática que parece ter lido todos os livros do mundo. Ao arriscar isso numa livraria, além do barulho da seção de CDs, do casal de namorados ocupando o único sofá disponível e do livro estar plastificado, um vendedor aparecera como águia te oferecendo para pesquisar o preço.
Vendedor, querido, literatura não devia ter preço. Eu não vou gastar as palavras.
Continuo então, a espirrar a poeira secular dos bons livros da biblioteca, com suas capas de couro remendadas, com frases grifadas, com anotações de rodapé, faltando a pagina 72 e a ser devolvido em 15 dias. Com sorte, aparece até um dedicado com amor em 1985.